sábado, 19 de julho de 2008

A elite brasileira e a fraternidade latinoamericana

Antes de Simón Bolívar as elites latino-americanas já levantaram seus canhões contra a fraternidade e união da América Latina. Todas as tentativas de manifestação das classes populares, de Tupac Amaru ao Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, foram reprimidas pela força ou pelo silêncio da historiografia oficial.
O século XXI segue, infelizmente, dando continuidade a essa sina. No Brasil, essa repressão ganhou uma roupagem diferente nos últimos anos. Disfarçada de nacionalista, a elite brasileira se faz de indignada diante das tentativas de mudança dos vizinhos latino-americanos.
Quando a Bolívia, na plena razão de seus direitos, propôs rever os contratos dos preços dos hidrocarburos, a elite, por meio da imprensa e de deputados do congresso soltou toda a sorte de injúrias. A revista Veja chamou o presidente Evo Morales de bandoleiro, publicou fotos ridicularizando as lideranças bolivianas e a comentarias Miriam Leitão chegou a propor, no comentário matinal do Bom Dia Brasil, na TV Globo, que o governo brasileiro chamasse o embaixador na Bolívia. Foi criado um clima de guerra. Poucas vozes se levantaram para defender os interesses bolivianos.
Quando o general Heleno falou, durante uma palestra, da suposta porosidade das fronteiras brasileiras por causa das reservas indígenas, novas indignações no Congresso e na imprensa. A sensação era que a Amazônia seria tomada por alguma tropa estrangeira ou seria, aos poucos, ocupada por legiões de estrangeiros colonos.
Nesta hora, vem à lembrança a música de Tony Osanah e Enrique Berger, Fruto do Suor, interpretada pelo grupo Raíces de América: a estupidez nos separou em bandeiras. O processo de formação dos estados nacionais na América Latina foi feito a partir de pactos de elite. Basta ler qualquer livro de história para lembrar que os conquistadores não levaram em conta, nem aqui, nem na África ou na Ásia, qualquer traço cultural autóctone, para desenhar fronteiras.
Mesmo depois dessas partilhas, os operários, camponeses, indígenas e mestiços dos diversos países latino-americanos guardam muito mais semelhanças que diferenças. Está no DNA dos movimentos de resistência da América Latina a busca pela fraternidade e união dos povos. A luta foi, é e será durante muito tempo, contra os colonizadores e exploradores que sugam os recursos naturais e mão-de-obra dos países latino-americanos. Os EUA e a Europa continuam impondo restrições ao produtos alimentícios e também criam atritos quando se trata de renegociar os preços dos recursos naturais.
Com a eleição de Fernando Lugo, no Paraguai, as elites brasileiras novamente se insuflaram diante da possibilidade de revisão no preço da energia comprada de Itaipu. Repete-se a histeria do caso boliviano. Fernando Lugo, Evo Morales, Hugo Chávez e Rafael Correa são colocados no mesmo balaio. Cobram do presidente Lula uma atitude "enérgica". Felizmente, o governo brasileiro, desde que Lula o assumiu, exerce uma política internacional digna de um país solidário latino-americano.
Ao contrário do que o ex-deputado João Melão escreveu no triste artigo publicado no jornal O Estado de S.Paulo de 26 de abril, o Brasil não está numa atitude inferiorizada. Como o maior país em território e como ex-aliado natural tanto da Europa, como dos EUA, o Brasil exerceu uma função sub-imperialista na América do Sul. Clique aqui e leia o artigo do professor Ivanil Nunes que mostra o papel do Brasil no comércio do Mercosul.
É natural que um governo que se diz progressista, tente rever as relações comerciais e aumentar o comércio sul-sul, única saída de desenvolvimento diante da opressão do norte.Eduardo Galeano, no excelente "As Veias Abertas da América Latina", sempre esteve certo. Nosso subdesenvolvimento está atrelado ao desenvolvimento capitalista europeu e norte-americano. Nossa pobreza é a riqueza deles. E para que isso mude o verdadeiro nacionalismo, o nacionalismo latino-americano, deve levar em conta a união dos povos da América Latina. O desenvolvimento brasileiro passa pelo desenvolvimento do Paraguai, da Bolívia, do Peru, do Equador, da Nicarágua...

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