sábado, 19 de julho de 2008

América Latina: uma Invenção Francesa

No México, o Presidente liberal Benito Juárez assentou as bases da livre iniciativa, implantou o federalismo e as garantias individuais, separou a Igreja do Estado, expropriou os bens do clero (até então senhor de metade das terras do país) e liberou os camponeses índios para se tornarem mão-de-obra assalariada, provocando a revolta da Igreja e dos conservadores. Juárez os venceu, mas a guerra civil trouxe dificuldades econômicas que o obrigaram a suspender os pagamentos da dívida externa, provocando a intervenção armada da Inglaterra, França e Espanha.
Os conservadores mexicanos aproveitaram a oportunidade para pedir ao império francês que assumisse a proteção da Igreja e de seus interesses e Napoleão III impôs como imperador do México o arquiduque austríaco Maximiliano em 1864. Benito Juárez se refugiou no norte do país, continuou a luta e, em 1867, venceu Maximiliano, que morreu fuzilado.
A intervenção francesa deixou uma marca interessante na cultura mexicana: os conjuntos musicais contratados para animar festas de casamento passaram a se chamar mariachis, o que nada mais é do que uma pronúncia castelhanizada do francês marriage (casamento). E também deixou uma marca na cultura continental: o conservador Napoleão III justificou sua agressão como um ato de defesa dos "povos latinos" contra o imperialismo liberal anglo-saxônico e seus ideólogos inventaram a expressão América Latina procurando tirar proveito do tradicional prestígio da cultura francesa entre os intelectuais latino-americanos para forjar uma unidade um tanto artificial desses países com a França imperial.
Posteriormente, intelectuais latino-americanos propuseram substituir esse termo por "Ibero-América" e "ibero-americanos", conceito que soma Brasil e os países hispano-americanos, mas exclui o Haiti e as colônias francesas. Esse conceito também é conservador: as culturas dos países ditos latino-americanos, moldadas em grande parte por contribuições indígenas e africanas, por imigrantes de diversas origens e por influências imperialistas pós-coloniais, está quase tão longe de ser puramente "ibérica" quanto de ser puramente "latina". O que nossos países têm de importante em comum não são suas raízes imaginárias no Lácio ou na Península Ibérica, mas sua experiência comum de colonização, mestiçagem, sincretismo cultural, escravidão, independência e luta contra a opressão. Entre duas opções no fundo igualmente artificiais, melhor ficar com o nome "América Latina", já consagrado pela tradição e pela aceitação popular.

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